Humberto Firmo - Calango do Cerrado

25 de abr. de 2012

Pagnalias




Pastoras, Selenas enfogueiradas
Irenes e Matildas.
Gabrielas e Morganas.
Onde está a mulher nessa mulher?

Beijo a beijo
Dois punhais em traição.

Mulher entre outras mulheres:
Madonas mandonas
Domingas dominadoras

Inimigas modernas:
Taiê e paletó
Seios e calcinhas
Gravata e cachecol
Clitóris em riste.

Pagãs:
Elvira e Maria

Por trás do balcão:
Suburbanas crucificadas
Joanas em tentação
Rosas despedaçadas.

Fridas possessivas
Anitas libertadoras
Electra, Antígona desesperadas
Cleópatra apaixonada

Emprego burocrático:
Perpétua a vida de repartição
Públicos gabinetes
Sedentas secretárias

Jocastas abandonadas
Nefastas incendiárias
Florbelas mitificadas

Pitonisas entorpecidas

Isís enlouquecida
Helenas cheias de maus-tratos
Medéias enfurecidas
Madalenas arrependidas

Maria imaculada
Imaculada pecadora
Esposas possuídas
Mães despreparadas

Educadora penitente
Isabela nervosa
Angélica prostituída
Mulher de vida fácil ?

Fátima visionária
Mulheres de gabinete:
Públicas e privadas
Secretárias de apontamentos

Governantas estilhaçadas
Domésticas escravizadas
Nefertites sacrificadas
Funcionárias chefiadas.

Ditadoras Gerentes
Amélias mitificadas
Renatas renitentes
Marcelas envaidecidas

Inesquecível Inês
Clarice psicológica
Batom,
Cor, flor do mês

Onde está a mulher nessa mulher?
Onde está a poção mulher
Dessa mulher?
                                      


Comovente


Os últimos suspiros
escorregam pelos versos,

Uns restos de lirismo.

Trânsito em Brasília



Antigamente a gente se matava
pulando da Torre de TV

_ colocaram grades na Torre.

Agora, os carros nos matam
e as torres anunciam nossas mortes
na TV.

Mimetismo


Ontem sonhei que o bar do kareca estava aberto
Lá dentro, Pesão recitava seus poemas
Dona Zumira fazia suas coxinhas

Ouvindo o som do Paraibola...

De um outro lado, numa mesa,
Miquéias Paz mimificava um canudinho.

A lua da satélite iluminava o balão do centro da cidade.

Lirismo


Cronoscopia

As horas passam
E na crucificação do tempo
Morre de velho
O último desejo.

Crônos, o senhor do século,
Organiza a mazela do destino.
E, como um asno a puxar entulhos,
Vai carregando os dias
Na miserabilidade do milênio.

Tempo, tempo, tempo...
Eis a história dos humanos
Que no correr veloz das eras,
Crucificam-se, feito bestas,
Aos ponteiros do relógio.

de brasilia

eu sou esse calango rastejante queimado ao sol
seco
 de couro escuro pelo sol

 sou o que vejo no quadrante e sinto na pele
 meu olhar vazado , abrindo estradas mirando o nascente e ao poente
 horizonteando a memoria do porvir

 arde na boca o fermento da poeira
 construindo a metafora de chao e betoneira
 erguendo algo de futuro e destruiçao

 sou esse rabo cortado e que ainda se mexe
 balançando a cabeça num porem
 sem saber se ainda estou vivo.

 ergo no olhar a mesma pantera de rilke
 de um lado a outro, subindo por tesouras
 contornando bloco, vez ou outra, mudo de direçao

 quando me vejo velho, barbudo,
 noto que a cidade ainda nao e meu pai
 e pergunto
 onde andara meus filhos
 entre blocos, ruas, e satelites adormecidas